Um peixe fora d'água


Sempre me senti um pouco diferente da maioria das pessoas que me cercam. Tenho gostos peculiares desde a infância e ouço que sou madura desde muito pequena. Quando criança, gostava de ver o por do sol. Na adolescência, preferia ler e ouvir música ao socializar ou praticar esportes. Mesmo sendo muito extrovertida e adorar jogar conversa fora, não são raros os momentos que me sinto deslocada e as vezes até inadequada. 


Durante muito tempo falava tudo o que pensava e acabava criando desafetos e conflitos sem necessidade. Hoje em dia me controlo um pouco mais, mas tenho me sentido cada vez mais só. 

Me tornar mãe causou uma grande mudança interna e me fez repensar interesses e prioridades. 
Ter filhos é divertido, alegre e nos enche de amor, mas também é cansativo, frustrante e solitário. Mesmo quando temos companheiros nessa viagem. 
É solitário porque por mais que outras pessoas também tenham filhos, a relação é somente entre você e seu filho. E isso é único. Não tem receita, nem devolução, nem treinamento. Vamos aprendendo na prática, muitas vezes sem nunca ter experimentado nada parecido. E como aceitar um cargo gerência, de alta responsabilidade, sem nunca ter trabalhado na área. 

Ter filhos muda nossa perspectiva, nossa carreira, nosso relacionamento com as outras pessoas. 
Porque precisamos nos doar para que outra(s) pessoa(s) exista(m). E nisso, sumimos um pouco. 
Me sinto cansada estar tão integralmente envolvida no universo infantil, mas quando tenho tempo livre estou lendo sobre educação, desenvolvimento infantil ou mesmo pesquisando brinquedos e passeios pra fazer com meus filhos. Fico até envergonhada de perceber quão sem capacidade de render outro assunto numa conversa eu me tornei. 
Não acho que a maternidade é uma obrigação, nem que é pra todas as mulheres. Mas é uma mudança na vida que eu não tinha experimentado até então. 
Se já me sentia um peixe fora d'agua antes, agora degringolou de vez. Nesse mundo cada vez mais virtual e individual, as crianças não estão incluídas em vários espaços e, nesse caso, as mães também não. 
Sei que um dia eles vão crescer e voar com as próprias asas. Mas, como vi num filme, mãe é sempre mãe. Mesmo quando os filhos já cresceram, já se foram...
Não existe ex-mãe. Se o marido morre, a pessoa se torna viúva. Se os pais morrem, se torna órfã. Se o filho morre, a mãe continua mãe. 
E não me refiro somente a mãe biológica. Mas a todas as pessoas que cumprem o papel de mãe. Que aceitam essa loteria que é cuidar de um ser humano. 
Fico pensando nas mães que perderam seus filhos na matança que acontece todos os dias nas favelas, nas que perderam ainda crianças e não posso imaginar sua dor. 
A verdade é que mesmo as que têm filhos saudáveis e felizes sempre estão na corda bamba, pensando no bem estar deles. 
Pensando bem, não me sinto mais só. Me vejo um pouco em cada mãe. 
Mas gostaria que o mundo se tornasse mais acolhedor à essas mulheres e seus filhos. Porque apesar de toda a complexidade da maternidade, não somos somente mães. 
Precisamos de espaço no mercado de trabalho, opções de estudo e lazer para que possamos ser mais do que mães.

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